UA escolhe Filipe Nyusi para chefiar missão eleitoral na Guiné-Bissau e reacende debate sobre credibilidade

Ex-Presidente moçambicano lidera equipa de observadores num processo marcado por tensões políticas e críticas à actuação de organismos regionais

A nomeação do antigo Presidente de Moçambique, Filipe Jacinto Nyusi, para chefiar a Missão de Observação Eleitoral da União Africana (UA) na Guiné-Bissau está a gerar um intenso debate político e diplomático dentro e fora do país. O anúncio, feito em Maputo pelo também ex-Presidente Joaquim Chissano, surge num momento em que o legado de Nyusi continua a ser alvo de controvérsias, sobretudo após as tensões pós-eleitorais que marcaram o final do seu mandato em 2024.

Anúncio feito por Chissano reacende debate sobre legado político de Nyusi

A informação foi tornada pública durante a cerimónia de atribuição do título de Doutor Honoris Causa a Joaquim Chissano pela Universidade que leva o seu nome. No discurso, Chissano destacou a tradição diplomática de Moçambique na mediação de conflitos no continente africano.

Contudo, a escolha de Nyusi reabriu discussões sobre as eleições gerais de 2024, que, contestadas pela oposição, desencadearam a mais intensa vaga de protestos em Moçambique desde o fim da guerra civil de 1992. A crise social que se seguiu ainda marca parte da avaliação pública do ex-Chefe de Estado.

Entre a mediação diplomática e as controvérsias internas

Para analistas internacionais, a nomeação coloca em evidência uma contradição dupla: por um lado, Moçambique é reconhecido pela sua tradição diplomática em processos de paz; por outro, o próprio Nyusi deixou o poder sob críticas relacionadas à gestão eleitoral e à repressão de manifestações.

Assim, a missão da Guiné-Bissau é encarada como um teste às capacidades diplomáticas do ex-Presidente e, simultaneamente, à credibilidade da UA na escolha dos seus enviados especiais.

Analistas alertam para perda de legitimidade das organizações regionais
Contactado pela Integrity Magazine, o analista político Alexandre Chiure classificou a nomeação como “um processo normal” dentro das práticas da UA. No entanto, sublinhou que o problema central está na perda de “legitimidade e relevância” das organizações regionais devido à falta de postura crítica em processos eleitorais contestados.

“As organizações têm fechado os olhos a questões democráticas. Relatórios de missões como as da SADC têm sido pouco críticos, o que as torna inócuas perante problemas reais”, afirmou Chiure, apontando exemplos como as eleições na Tanzânia.

O especialista defendeu que a actuação das missões de observação deve ser “mais rigorosa e transparente” para recuperar a confiança dos cidadãos africanos.

Missão na Guiné-Bissau será prova decisiva para UA e para Nyusi

As eleições guineenses de domingo decorrem sob forte expectativa, num contexto marcado pela exclusão de candidaturas, disputas institucionais e alertas de organismos internacionais para o risco de nova crise pós-eleitoral.

Para Filipe Nyusi, chefiar a missão da UA representa uma oportunidade para redefinir a sua imagem no pós-Presidência, apresentando-se como mediador continental.

Para a União Africana, será uma prova de coerência, especialmente no que diz respeito aos critérios de selecção de líderes de missões eleitorais e ao compromisso com padrões de governação democrática.

O relatório final da missão deverá ser lido sob duas lentes: a análise sobre o processo eleitoral guineense e, sobretudo, o que revelará sobre a capacidade da UA em promover eleições credíveis e sobre a evolução do legado político de Filipe Nyusi.


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