CIP alerta que ajuste directo na gestão da Janela Única Electrónica pode favorecer cartéis e prejudicar o Estado

O Centro de Integridade Pública (CIP) alerta que a decisão do Governo de adjudicar, por ajuste directo, o contrato de manutenção e modernização da Janela Única Electrónica (JUE) pode abrir espaço para práticas de favorecimento e legitimar “cartéis que lesam o Estado”. A conclusão consta de uma análise divulgada esta segunda-feira, após o anúncio de que a Mozambique Community Network (MCNET) continuará a gerir o sistema, responsável pelo desembaraço aduaneiro desde 2010.

A MCNET é um consórcio liderado pela Escopil Internacional, que integra ainda a multinacional suíça SGS (Société Générale de Surveillance), o Governo e a CTA.

“Ajuste directo elimina concorrência”

Segundo o CIP, a escolha por ajuste directo em sectores sensíveis como comércio externo e receitas aduaneiras impede concorrência e reduz a possibilidade de identificar soluções tecnológicas mais modernas, seguras e economicamente vantajosas.

A organização recorda que, em 2016, já havia classificado o modelo da JUE moçambicana como “um dos menos populares do mundo”, quando analisou alternativas usadas internacionalmente, como:

  • Intrasoft International (referência europeia em TI);

  • ASYCUDA, da ONU, usado em cerca de 90 países, incluindo membros da SADC e vários PALOP;

  • Webb Fontaine, com plataformas em Nigéria, Arménia, Filipinas, Benim, Bahrein, Camboja e Gana;

  • TRIPS™, da Crown Agents, que integra gestão aduaneira com IVA e impostos internos.

Para o CIP, a existência de alternativas amplamente testadas demonstra que o Governo deveria justificar “de forma robusta” a necessidade de contratação restrita.

Histórico marcado por falta de transparência

A organização relembra que o primeiro concurso público da JUE, lançado em 2009, foi marcado por irregularidades que terão favorecido o consórcio SGS/Escopil, incluindo:

  • aumento das taxas pagas à MCNET,

  • inexistência de redução dos custos de desembaraço,

  • conflitos de interesse,

  • e uma estrutura accionista que beneficiava privados em detrimento do Estado, que recebia apenas 20% das receitas.

O CIP teme que a repetição de processos pouco competitivos reforce riscos de favoritismo, captura institucional e decisões desalinhadas com o interesse público.

Exige-se transparência na escolha do parceiro
A entidade exige que o Governo torne públicos:

  • os critérios que justificaram o ajuste directo,

  • as razões para descartar alternativas tecnológicas internacionais,

  • os critérios técnicos e financeiros considerados,

  • os custos previstos para o Estado e para os utilizadores,

  • e o estudo de avaliação da actual JUE, que deve fundamentar a continuidade da concessão.

“Sem informação detalhada, avaliação independente e consulta a sectores relevantes, há risco de as condições contratuais beneficiarem mais a concessionária do que o Estado”, alerta o CIP, sublinhando que o sistema afecta toda a cadeia logística — importadores, exportadores, CFM, operadores portuários e aduaneiros.

Nova plataforma pode integrar vários actores do sector

Uma fonte ligada ao processo disse ao jornal Carta que a futura solução será designada Plataforma Única de Facilitação do Comércio, integrando Alfândegas, CFM, Porto de Maputo e outras entidades logísticas, com o objectivo de acelerar e simplificar operações comerciais.

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