Ciclovias em Quelimane: Uma boa ideia que exige mais planeamento e diálogo

Manuel de Araújo, autarca de Quelimane, voltou a estar no centro das atenções ao lançar, esta semana, a primeira pedra para a construção de ciclovias numa das avenidas da cidade. O gesto reacendeu debates intensos entre automobilistas, ciclistas, urbanistas e munícipes. Para uns, as ciclovias irão “apertar” ainda mais as faixas de rodagem numa urbe onde o trânsito já é complicado; para outros, trata-se de uma iniciativa necessária numa cidade reconhecida nacionalmente como a “capital da bicicleta”.

Apesar da intenção positiva, a iniciativa levanta questões legítimas que merecem reflexão atenta.

Foram as estradas concebidas para ciclovias?
A maioria das vias de Quelimane — como acontece noutras cidades do país — foi desenhada a pensar sobretudo nos veículos motorizados. A bicicleta, apesar de amplamente utilizada, nunca foi integrada de forma estruturada no planeamento urbano. Introduzir ciclovias hoje implica reconfigurar espaços que não foram concebidos para elas, exigindo estudos, cálculos e soluções técnicas adequadas. A questão que permanece é: esse trabalho foi feito?

Houve auscultação pública?
A falta de consulta é um problema recorrente na governação local. Muitas decisões partem de visões políticas internas e não necessariamente da realidade dos munícipes. Antes de avançar com as ciclovias, teria sido importante ouvir automobilistas, ciclistas, transportadores semicolectivos, moradores e especialistas em mobilidade urbana. Sem esse diálogo, corre-se o risco de implementar uma iniciativa bem-intencionada, mas pouco ajustada ao quotidiano da cidade.

Porque surge a ideia e qual é o seu valor?
As ciclovias fazem parte de um movimento global em defesa da mobilidade sustentável. Quelimane, pela sua tradição ciclável, tem potencial para ser uma referência nacional. Se bem estruturadas, as ciclovias podem:

  • Reduzir acidentes entre bicicletas e viaturas;

  • Organizar o fluxo de trânsito;

  • Incentivar o uso da bicicleta como meio de transporte económico e saudável;

  • Valorizar a imagem urbana;

  • Criar oportunidades económicas no sector das bicicletas.

A ideia é positiva; o desafio é a sua execução.

E o ciclista será obrigado a usar a ciclovia?
Este ponto também carece de clarificação. Se existem ciclovias, o seu uso precisa de ser regulamentado. No entanto, aplicar sanções antes de garantir condições adequadas seria injusto. Antes de pensar em multas, o município deve assegurar:

  • Ciclovias contínuas, seguras e bem sinalizadas;

  • Campanhas de sensibilização;

  • Regras claras e acessíveis;

  • Infra-estruturas que tornem a ciclovia realmente prática e segura.

Uma oportunidade para modernizar Quelimane
As ciclovias podem tornar-se um marco positivo na modernização da cidade, melhorar a mobilidade, reduzir acidentes e reforçar a identidade ciclável de Quelimane. Mas para isso, é preciso mais do que um acto político: é necessária uma política pública séria, participativa e sustentada em estudos técnicos.

Só assim Quelimane poderá afirmar-se como modelo nacional de mobilidade urbana — e não apenas mais um exemplo de boa ideia mal executada.


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