Essa notícia revela uma preocupação importante do Tribunal Administrativo (TA) de Moçambique em relação à gestão e fiscalização dos custos recuperáveis declarados pela TotalEnergies, empresa que lidera a exploração de gás natural na bacia do Rovuma.
Aqui está uma explicação e análise resumida do conteúdo:
Contexto
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O Instituto Nacional de Petróleos (INP) é a entidade responsável por supervisionar e auditar as despesas apresentadas pelas companhias petrolíferas que operam no país.
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As empresas de petróleo e gás podem declarar determinados “custos recuperáveis” — despesas operacionais e de investimento que podem ser deduzidas antes da partilha de lucros com o Estado.
Preocupações do Tribunal Administrativo
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Custos em Crescimento:
A TotalEnergies tem apresentado valores crescentes de custos recuperáveis desde 2023. Em 2024, declarou mais de 1,16 mil milhões de dólares (USD 1.163.671.314), um aumento que levanta dúvidas sobre a proporcionalidade e a transparência desses gastos. -
Risco para as Receitas do Estado:
Quanto mais altos forem os custos recuperáveis, menor será a fatia de receitas que o Estado moçambicano recebe — pois esses custos são descontados antes da partilha dos lucros. -
Exigência de Maior Rigor:
O TA pede ao INP maior rigor técnico e financeiro na análise e validação dos relatórios trimestrais da TotalEnergies, para evitar a aceitação de despesas indevidas e proteger os interesses do Estado.
Interpretação
Esta intervenção do Tribunal Administrativo mostra uma preocupação crescente com a transparência e a boa governação no setor do gás natural — um dos pilares da economia moçambicana.
Sugere também que há desafios na capacidade de fiscalização do Estado, especialmente num contexto em que os projetos são complexos e envolvem grandes volumes de investimento estrangeiro.
Refira-se que são considerados custos recuperáveis as despesas que podem ser devolvidas ou ressarcidas pelo Estado às empresas, seja por meio do sistema tributário, contratos ou outros mecanismos que permitem a uma entidade ser reembolsada pelos gastos incorridos numa determinada operação. Em Moçambique, compete ao INP assegurar o controlo dos custos incorridos na fase de exploração, devendo observar, acompanhar a execução das operações petrolíferas e inspeccionar todos os bens, registos e dados na posse do operador.
De acordo com o Relatório e Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2024, até Dezembro do ano passado, a TotalEnergies tinha declarado custos recuperáveis no valor de 13.673.346 mil USD, o correspondente a 43,8% do total de custos. Deste valor, o Instituto Nacional de Petróleos auditou 7.600.699 mil USD (55,6%), entre 2015 e 2022, tendo aprovado 7.283.080 mil USD e reprovado 317.619 mil USD (4,2%), a maior cifra dos custos rejeitados pelo INP. Neste momento, decorre a auditoria dos custos recuperáveis de 2021 a 2024, que coincide com o período de paralisação do projecto.
“Considerando que, até 31/12/2024, a TotalEnergies traduzia o maior risco em razão de ter sido nela em que foi detectada a maior parte dos custos não aceites, o regulador deve ser rigoroso na análise dos relatórios trimestrais desta concessionária de modo a recomendar, quanto antes, a correcção das anomalias eventualmente detectadas nos relatórios”, afirma o Tribunal Administrativo, no Relatório e Parecer da Conta Geral do Estado de 2024.
Lembre-se que a petroquímica francesa anunciou, neste fim-de-semana, a retirada da “Força Maior”, declarada em Abril de 2021, após ataques terroristas de 24 de Março à vila de Palma, dias depois de ter retomado a obra de construção da Fábrica de Liquefação de Gás Natural. No entanto, sabe-se que, durante as negociações com o Governo, a empresa reclamava custos recuperáveis de 4.9 biliões de USD durante a suspensão do Projecto, provenientes de despesas que alegava continuar a ter no distrito de Palma.
MRM é responsável por mais da metade dos custos recuperáveis declarados
De acordo com o Relatório do Tribunal Administrativo, o consórcio Mozambique Rovuma Venture (MRV), que opera o Bloco 4 da Bacia do Rovuma, é responsável por mais da metade dos custos recuperáveis reportados pelas multinacionais do sector de hidrocarbonetos durante as suas operações. Até 31 de Dezembro de 2024, o consórcio liderado pela ENI tinha reportado 15.971.343 mil USD de custos recuperáveis, o que equivale a 51.1% do total dos custos imputados ao Estado moçambicano.
De acordo com o Relatório e Parecer da Conta Geral do Estado de 2024, até 31 de Dezembro de 2024, os custos recuperáveis reportados por todas as petrolíferas ao regulador ascendiam a 31.252.229,6 mil USD, excluindo os da Sasol que, por adoptar um período contabilístico específico (Julho de um ano a Junho do ano seguinte), reporta os seus custos a 30 de Junho. A companhia sul-africana declarou, a 30 de Junho de 2024, custos recuperáveis na ordem de 1.332.741 mil USD.
“Os custos recuperados, no valor de USD 2.139.555,4 mil são todos relativos à MRV, deduzidos no âmbito da partilha do ‘Petróleo-Lucro’, realizada desde 2023”, explica o documento, revelando que, apesar de a Sasol ter iniciado a produção, em Maio de 2024, o mesmo período em que inicia partilha, “não há registo, nos relatórios específicos de custos recuperáveis, das deduções realizadas”.
No entanto, dos custos recuperáveis reportados pelas empresas, o Tribunal Administrativo diz ter sido auditado, pelo INP, apenas um valor correspondente a 61,5% do total declarado. Isto é, foram auditados os custos recuperáveis de um montante de 19.210.362 mil USD, dos quais, 18.827.159 mil USD foram aprovados e 361.239 mil USD reprovados (11,5%).
Em concreto, o Instituto Nacional de Petróleos auditou, entre 2015 e 2019, 11.286.807 mil USD (70,7%) dos custos recuperáveis declarados pelo MRV, tendo aprovado 11.264.640 mil USD e reprovado 22.167 mil USD (0,2%). Também auditou 300.892 mil USD da Sasol, entre 2017 e 2019 e em 2021, tendo aprovado 279.439 mil USD e reprovado 21.453 mil USD.
Para o Tribunal Administrativo, “a cifra de 11,5%, dos custos recuperáveis não adequados, revela a necessidade de o regulador [Instituto Nacional de Petróleos] massificar as suas acções de controlo das operações reportadas pelas concessionárias, visando garantir que, no futuro, o Estado não venha a perder receitas por conta das eventuais deduções”.
O Plenário do Tribunal Administrativo entende ainda que a entrada da MRV para a fase de produção aumentou a necessidade de o país reforçar a capacidade de supervisionar as operações petrolíferas, considerando a grandeza do projecto e o nível de complexidade que envolve o processo de liquidação dos impostos e da partilha do ‘Petróleo-Lucro’ e “acentua-se com a entrada da SPM, Lda., independentemente de se tratar de um projecto de dimensão relativamente menor”.
Aliás, o Tribunal Administrativo diz ainda que o regulador do sector de petróleos (INP) tem sido ignorado pelas concessionárias, que continuam a apresentar saldos irrealistas, “numa evidente afronta à validade das auditorias realizadas”. “Esta realidade representa, também, um risco de, ao longo do projecto na partilha do ‘Petróleo-lucro’, os custos não aceites virem a ser incorporados no ‘Petróleo-custo’ e, em razão disso, serem deduzidos, em prejuízo da receita do Estado”, alerta.
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